Não raro, as operadoras de planos de saúde oferecem negativas aos pedidos de medicamentos efetuados por seus clientes. Normalmente, nos casos em que há prescrição médica, essa postura é revertida por ordem judicial.
Nesse sentido, julgou a Excelentíssimo Juiz, Doutor Celso Alves de Rezende, da 7ª. Vara cível de campinas.
Trecho dadecisão:
O cerne litigioso funda-se na pretensão cominatória para compelir a operadora no custeamento de tratamento de quimioterapia com uso do medicamento Votrient (pazopanibe), de acordo com prescrição médica, ante a negativa sob a justificativa de ausência de cobertura perante o Rol de Procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, consoante Resolução Normativa n.º 387/2015. Conquanto seja lícito que o plano de saúde estabeleça quais as moléstias cobertas, não se admite sua escolha do tipo de tratamento que deverá ser adotado com a finalidade de cura, afinal esse se trata de prescrição médica de área especializada, de forma que somente os profissionais médicos e equipe técnica que assistem o paciente podem atestar qual a técnica a ser empregado no tratamento.
No presente caso, o médico que assiste a autora elaborou relatório médico para a operadora, com descrição minuciosa da doença e de sua gravidade. De acordo com o médico, a paciente “é portadora de LEIOMIOSSARCOMA retroperitoneal (CID C-48), tratado cirurgicamente em 21/12/2015, seguido de radioterapia. Em 23/08/2107, a Sra. Ana Rosa foi diagnosticada com recidiva peritoneal (devidamente comprovada por biópsia) e foi submetida a quimioterapia de 1.ª linha paliativa com Gemzas/Taxotere. Houve resposta inicial ao tratamento, porém progressão revelada pela ressonância magnética do abdômen após o 6.º ciclo de QT. Diante do exposto, recomendei tratamento de 2.ª linha com Pazopanibe (Votrient) 800mg/dia, conforme recomendação dos principais guidelines (nacionais e internacionais) para o caso. Informo que se trata de paciente com histologia não-adipocítica, com enfermidade no estádio IV, na 2.ª linha de tratamento paliativo, e perfeitamente dentro dos critérios de inclusão do estudo fase III “Palette” (anexo). Ademais, o medicamente proposto é comercializado no Brasil, e a indicação é contemplada em bula (anexo). […].”quimioterápico de uso oral, produzido pelo laboratório farmacêutico Glaxo Wellcome S.A., que tem como indicações de bula o tratamento do carcinoma de células renais (CID 10: C64) avançado para pacientes que já tenham sido tratados previamente com citocinas. Segundo a bula, este medicamento também está indicado para o tratamento de alguns subtipos de sarcoma de tecidos moles, avançado. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa concedeu a autorização para que o Pazopanibe (Votrient), da Glaxo Wellcome SA, Registro ANVISA n.º 1006811360010 Votrient, para o tratamento de pacientes com carcinoma de células renais (RCC)
De acordo com a Nota Técnica n.º 2710/2018 – CGJUD/SE/GAB/SE/MS, do Ministério da Saúde, “o medicamento Pazopanibe (Votrient®) trata-se de um antineoplásico, possui registro na ANVISA e em sua bula indicação para o tratamento de pacientes com sarcoma de partes moles (STS) avançado, que receberam quimioterapia prévia, excluindo-se pacientes com tumor do estroma gastrintestinal (GIST) ou STS adipocitário. É indicado também, para o tratamento de carcinoma de células renais (CCR) avançado e/ou metastático, uma forma de câncer nos rins.”
Por sua vez, o Parecer Técnico n.º 27/GEAS/GGRAS/DIPRO/2018, da Agência Nacional de Saúde Suplementar ANS estabeleceu como obrigatório a cobertura por planos de segmentação ambulatorial, hospitalar (com ou sem obstetrícia) e por planos-referência de procedimento de Terapia Antineoplásica Oral para tratamento do câncer, com Diretriz de Utilização – DUT, listado no Anexo I da Resolução Normativa n.º 428/2017, sendo a substância Pazopanibe indicada para o tratamento de pacientes com carcinoma de células renais, irressecável ou metastático em primeira linha.
No atual Rol Procedimento da Agência Nacional de Saúde Agência Nacional de Saúde Suplementar ANS, não há previsão da utilização da substância Pazopanibe (Votriet) como opção terapêutica para o tratamento do sarcoma de partes moles, conforme indicação descrita na bula. Contudo, é irrelevante, ‘in casu’, a falta de expressa anotação do tratamento solicitado nas resoluções da Agência Nacional de Saúde Suplementar ANS, mesmo porque as “Diretrizes de Utilização” das Resoluções Normativas são meramente exemplificativas das possibilidades de acesso ao tratamento, pois não tem condições de elencar todos os procedimentos médicos que são diariamente modernizados. Ademais, cabe ao médico a decisão quanto à prescrição de acordo com o caso concreto de cada paciente não.
Como se sabe, a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS tem, dentre outras funções, a de regulamentar os procedimentos obrigatórios que devem ser cobertos pelos planos de saúde, todavia, seu poder de regulamentar não é ilimitado, mas complementar à lei dos planos de saúde. Isto quer dizer que a ela cabe publicar o rol mínimo de coberturas, não tendo poder para restringir ou limitar a responsabilidade das operadoras, que advém da lei e dos contratos celebrados com os consumidores. Nesse caso, a negativa de cobertura de custeio por ausência de previsão no rol de procedimentos da ANS é abusiva, entendimento consolidado pela Súmula 102 do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, ‘in verbis’: “Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.” Neste sentido, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo aprovou a Súmula n.º 96, cujo enunciado possui a seguinte redação: “Havendo expressa indicação de exames associados a enfermidade coberta pelo contrato, não prevalece a negativa de cobertura do procedimento.” A substância Pazopanibe (Votrient) foi devidamente registrada na ANVISA e teve a sua inclusão na lista de medicamentos fornecidos pelo SUS após análise das evidências cientificas quanto à eficácia do medicamento, além da avaliação econômica do custo-benefício. Apesar de ser indicada para câncer de rim, em sua bula há indicação para o tratamento de pacientes com carcinoma de células renais, irressecável ou metastático em primeira linha
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Por estas razões, a requerida não pode se negar à cobertura de exames e tratamento indicado pelo médico para doença abrangida pelo contrato, considerando-se abusiva a negativa de autorização de exames e tratamentos que a exclui, especialmente porque essa se contrapõe aos objetivos inerentes à própria natureza do contrato, além de implicar em violação ao artigo 51, inciso IV e § 1.º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor, bem como artigo 424 do Código Civil.
Por tudo isso, caso tenha recebido uma negativa abusiva, reúna os documentos necessários e busque o apoio de um escritório advocacia especializado em saúde para o devido ajuizamento de um processo contra o plano de saúde.
Saiba mais: Tutela de urgência
Macena Silva, Advocacia Especializada em Saúde, pode esclarecer suas dúvidas em relação ao seu direito na área da saúde.